O Brasil é o segundo país com mais casos de burnout segundo estudo da International Stress Management Association (Isma-BR), ficando atrás somente do Japão, onde 70% da população é afetada pelo problema. Diante dos números e do movimento janeiro branco, que visa conscientizar a sociedade sobre a importância de uma boa saúde mental, é natural que surja a dúvida de como o trabalho afeta a saúde psíquica das pessoas. Seria ele um fator de risco que poderia levar, por exemplo, ao suicídio? O burnout, que é o esgotamento profissional, seria uma espécie de estágio para isso?
Marcos Mendanha, médico do trabalho e autor do do livro O que ninguém te contou sobre o burnout, publicado pela Editora Mizuno, estuda essa relação e explica se há conexão entre os dois fatores ou não. “O primeiro ponto que precisamos considerar é que o trabalho pode sempre favorecer ou comprometer a saúde de qualquer indivíduo, independentemente da área em que a pessoa atua“.
Outro ponto que o médico explica é que há casos pelo mundo em que o suicídio foi associado ao trabalho. “No Japão, em 2017, 208 suicídios foram oficialmente considerados karojisatsus, ou seja, quando um trabalhador tira a própria vida por problemas mentais que podem ser ligados a experiências no ambiente profissional. Em um caso célebre, Matsuri Takahashi, uma funcionária de 24 anos de um escritório de publicidade, se matou após fazer mais de cem horas extras nos meses antes de sua morte, em 2015. Autoridades japonesas concluíram que o volume de trabalho excessivo levou à morte da jovem”.
Por outro lado, o especialista ressalta que cada caso deve ser avaliado individualmente, visto que o trabalho também é uma via da existência que promove possibilidades, conexões e também saúde. “Sim, é verdade que existem trabalhos adoecedores sob todos os aspectos. Mas é inegável também que, para muitos, o trabalho é fonte, não só de sustento, mas de novas amizades, rede de apoio e até sentido de vida.”.
Mendanha alerta que sempre correlacionar trabalho como fator de risco ao suicídio é ignorar os dados científicos e outros fatores que envolvem o contexto de vida em sociedade. “Segundo a OMS, o desemprego sim é considerado um importante fator de risco para o suicídio, pois, além de privar o indivíduo das relações sociais que o trabalho promove, ameça sua subsistência, e em muitos casos, a subsistência de toda sua família também”, exemplifica ele.
Em relação ao burnout, que é o esgotamento profissional, o médico reforça que “devemos nos atentar aos casos de burnout e adoecimentos mentais, e encaminhar essas pessoas, o quanto antes, para um tratamento eficaz e multidisciplinar.” Segundo o médico, o burnout, assim como qualquer agravo de ordem mental, pode funcionar como gatilho para uma ideação suicida, a depender da vulnerabilidade individual de cada paciente. “Vivemos uma época desafiadora. Esse assunto é urgente e necessário. Os dados nos mostram que, para promover a vida e a saúde mental com seriedade e responsabilidade, é necessário conversas difíceis, multisetoriais e para além daquelas que são disseminadas nas redes sociais”, finaliza ele.
Sobre Marcos Mendanha
Dr. Marcos Mendanha é Médico do Trabalho, Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas. Advogado especialista em Direito do Trabalho. Autor dos livros “O que não te contaram sobre Burnout – Aspectos práticos e polêmicos” (Editora Mizuno). Coautor do livro “Desvendando o Burnout – Uma Análise Multidisciplinar da Síndrome do Esgotamento Profissional” (Editora LTr). Diretor e Professor da Faculdade CENBRAP. Coordenador do COSMO (Congresso de Saúde Mental Ocupacional). Consultor de Saúde Ocupacional Corporativa.